Imagem capa - Livro PAI & MÃE por Lisette Revoredo Guerra

Livro PAI & MÃE


Capa dura, 292 páginas, tamanho 21x22 cm, 4x4 cores

 

No livro "Pai&Mãe" os retratos de pais, mães e filhos desvendam os traços, os jeitos e as expressões da família e de suas circunstâncias diárias e eterniza com delicadeza e beleza as fotos de família. Mulheres grávidas, e depois com seus bebês, mostram este vínculo eterno. A obra é apresentada por Lya Luft e Moacyr Scliar. (visualizar fotos)



MÃE: visão singular de um tema eterno


Quando Lisette me pediu um pequeno texto sobre seu livro de fotos com mães, pais e crianças, tive receio de ser repetitiva ou piegas. O tema maternidade(e ultimamente o de paternidade)começa a ficar batido,cantado há séculos em todos os gêneros possíveis .
Porém, quando vi as fotos, tive de reconhecer que o bom artista  sabe retomar temas mais do que frequentes, sem um traço de pieguice ou monotonia: Lisette Guerra conseguiu isso. Maternidade (paternidade, por ricochete), tem essa singular mistura de delicadeza e dramaticidade, de entusiasmo e cansaço, de espanto, surpresa, e ternura.
A cada dia lidamos com esse novo ser humano que abre pétalas de flor ou galhos de pequena árvore, e nos surpreende com frutos e flores nunca imaginados. Nos exaure com cuidados que pensamos ser incapazes de manter. Nos deixa humildes, encantados, furiosos, desanimados, e mais uma vez deslumbrados.
Nada é melhor e mais difícil, mais cansativo e mais sublime, do que trazer ao  mundo uma criança, e reconhecer nela, a cada dia, frágil e forte, autônoma e carente, exatamente  o mesmo que nós: uma pessoa.

Lya Luft





Ser pai    


Ser mãe, diz o famoso poema de Coelho Neto, aquele que o pessoal mais velho obrigatoriamente recitava quando estava no colégio,  “é desdobrar fibra por fibra o coração”. Pode ser. Mas ser pai é inquietar-se com qualquer dorzinha no peito, qualquer palpitação: meu Deus, não vai me dizer que estou sofrendo do coração, não faça isso comigo, por favor, meu Deus, estou com muitos problemas, dívidas para pagar, a família para sustentar, o emprego a perigo, não posso ficar doente agora, meu Deus, de jeito nenhum, deixe isso para mais adiante, prometo que no futuro entrego fibra por fibra o coração, mas agora não dá, me livra disso, por favor.
Ser mãe, continua o poema que emociona os brasileiros e as brasileiras há gerações, “é andar chorando num sorriso”. Mas ser pai é nunca poder chorar. Pai tem de ser forte, pai tem de aguentar as adversidades no osso do peito, é dizer a si próprio “as coisas vão melhorar”, enquanto lê com apreensão as notícias de jornal.
Ser mãe, prossegue o poema, “é ter um mundo e não ter nada”. Ser pai também é ter um mundo, mais os impostos do mundo, mais a feroz competição do mundo, mais as cobranças. Melhor seria não ter nada? Nem pensar. “Nada” é uma palavra que não existe em vocabulário de pai. “Tudo”, sim. Tudo o que ele precisa enfrentar, tudo o que ele precisa conseguir.
Ser mãe, conclui o poema, numa frase que é famosa, “é padecer num paraíso”. Ser pai é tentar descobrir onde se encontra o paraíso – é num condomínio? Num prédio de apartamentos em zona residencial? Numa casa na praia? – e fazer o possível e o impossível para acomodar ali a família e os filhos, com um condomínio que não o faça, a cada mês, arrancar os poucos cabelos que porventura restam.
Ser pai é isso. Mas também é ter uma mulher que é companheira, é ter filhos que representam uma realização e que um dia crescerão para serem pais e mães. Ser pai também é uma glória. Ainda não cantada em poema, claro, mas isso um dia acontecerá. 

Moacyr Scliar




Fazia muito frio quando Lisette Guerra chegou lá em casa. Era agosto ainda, o Bernardo tinha só dez dias de vida, obviamente não havia como ele compreender o que se passaria em seguida. Lisette pediu que lhe sacássemos as roupas. Queria-o nu para a sessão de fotos. Fiquei com o peito confrangido. Era necessário mesmo despi-lo? Sim, Lisette foi peremptória, ele devia estar como nasceu.

Que remédio? Tiramos as roupinhas dele. Que, claro, começou a chorar. Nenhum ar-condicionado lhe devolveria a sensação de proteção que as roupas pelo menos sugeriam fora do calor do útero materno. A sessão de fotos não terminava, eu já estava ficando nervoso. De repente, a Lisette exclamou:

- É essa!

E só clicou mais uma ou duas vezes. O Bernardo pôde ser vestido de novo, enfim, e enfim parou de chorar. Achei que a Lisette tinha encerrado o trabalho apenas por causa dos protestos do filho e da ansiedade do pai. Mas depois entendi que não. Quando vi a foto pronta, transformada em quadro, exposta ao público, admirei-me: era exatamente aquele momento em que ela concluiu que tinha o que queria. E, de fato, aquele instante mostrou de alguma forma o que eu sentia com aquele menininho cabendo nas palmas das minhas mãos: era como se eu segurasse o mundo todo, ou pelo menos tudo o que existia de importante no mundo, para mim. Olhe: ali estamos nós, eu e o meu pequeninho, e nada mais. Eu com todo o mundo nas mãos. Tanta, tanta coisa, e tudo coube na lente da Lisette.

David Coimbra, escritor e jornalista, pai de Bernardo





Mãe e filho, siameses de coração.


O primeiro som do filho não é o chorinho que comove o coração da mãe. O primeiro som do bebê não é o balbuciar confuso que lembra um balido de ovelhas, mas que todas as mães reconhecem como um primeiro chamado: “mama!”. O primeiro som que estabelece um vínculo eterno entre mãe e filho é o trotear do coração na ecografia fetal. Qual a mãe que não se lembra do exato momento em que ouviu aquela música compassada, para ela, soando como ruflar de tambores celestiais emitidos por um anjo de dentro de seu ventre.
Mais precisamente: pelo coração de um anjo , que apenas com 26 semanas já se movimenta, impõe seu ritmo, demonstra sua vitalidade, ocupa seu espaço e gera um som inesquecível. É neste exato momento que se estabelece um pacto eterno entre o coração da mãe e do filho, os dois se sincronizam e a partir daí, por toda uma vida pulsam em uníssono, no mesmo tom, na mesma oitava, em absoluta harmonia.
Mais tarde, após a terrível experiência do parto, a criança assustada, coração aos pulos, só lhe volta à calma se estiver deitada sobre a mãe, peito contra peito, coração contra coração, com se a paz de um se transmitisse ao outro. Esta energia que só a natureza soube criar une coração de mãe e de filho por toda a existência, mesmo quando a vida tem o capricho de distanciá-los. Uma estranha energia ainda não identificada interliga a ambos, que permanecem em harmonia mesmo a milhas dos olhos, mas sempre siameses de coração.
Coração de mãe, coração de filho é um só coração em duas pessoas, quase como um mistério da dualidade una ou da unidade dupla. Este arranjo siamês da natureza perdura para sempre até a morte de um dos dois. Mas aí vem o mistério dentro do mistério. O coração do filho suporta a morte do coração da mãe. Mas o coração da mãe nunca se conforma com a perda do filho, sofre, se dilacera, e termina por morrer também.
Dr. Fernando A. Lucchese, cirurgião Cardiovascular e escritor